22 de jul. de 2009

China se prepara para ser a ‘número 1’ da indústria automobilística

Expectativa da indústria chinesa é vender 11 milhões de veículos em 2009.
Se o resultado se confirmar, Xangai ganhará o título de 'a nova Detroit'.


Imagine uma metrópole próspera e rica, de prédios suntuosos e grandes shoppings, iluminada por letreiros multicoloridos e que abriga a base da indústria de seu país, em especial, a automobilística. Se pensou em Detroit ou em qualquer outra grande cidade norte-americana, errou até o continente. Trata-se de Xangai, o maior centro econômico e comercial da China. A megalópole incorpora em cada esquina a obsessão chinesa – cada dia mais real – de se tornar a principal potência mundial: já neste ano a cidade deverá ganhar o título de “a nova Detroit”. Isso porque a expectativa da China é vender 11 milhões de veículos em 2009, enquanto os Estados Unidos não deverão passar das 10 milhões de unidades.



De acordo com a Associação de Fabricantes de Veículos da China (CAAM, sigla em inglês), em 2008 foram licenciados no país 9,38 milhões de veículos. O salto nas vendas em meio a uma crise mundial só é possível, segundo a entidade, graças às medidas do governo chinês para estimular o consumo.



Mesmo assim, é o mercado que mais cresce no mundo, o que não é de se estranhar ao levar em conta a população de
mais de 1,3 bilhão de pessoas. O país possui 48 montadoras de origem chinesa e, boa parte, pertence ao governo chinês. Se for contar as joint ventures formadas com empresas estrangeiras, o volume duplica.



“A tra
nsferência da hegemonia norte-americana para o sul da Ásia é nítida. A impressão que temos é de que a China tem estrutura econômica suficiente para manter o crescimento econômico, mesmo na fase de crise”, diz a professora do departamento de planejamento e análise econômica da escola de administração de empresas da FGV, Celina Ramalho. Segundo ela, daqui a quatro anos a China terá produtos no padrão do mercado automobilístico ocidental.



Exemplos disso são os números anunciados nesta quinta-feira (16) pelo Bureau Nacional de Estatísticas de que o Produto Interno Bruto da China registrou crescimento de 7,9% no segundo trimestre de 2009 em relação ao mesmo período do ano anterior, após avançar 6,1% nos primeiros três meses do ano. Já a produção industrial avançou 9,1% em ritmo anual no segundo trimestre de 2009, após subir 5,1% nos primeiros três meses do ano. Em junho, a produção cresceu 10,7% em ritmo anual.



Assim, a confirmação da superação da indústria automobilística nada mais é do que o dragão chinês mostrando os dentes ao mercado mundial. De acordo com o presidente da Câmara de Comércio Brasil e China (CCIBC), Charles Tang, o grande objetivo das montadoras é exportar. E as fábricas já preparam suas linhas para aumentar a capacidade de produção. “A China ganha competitividade pelo preço. Um Chery Tiggo com vidro elétrico e ar-condicionado sai na China pelo mesmo preço que um Fiat Mille sai no Brasil”, observa Tang.



Para Celina Ramalho, o país irá investir fortemente no mercado externo, quando os países se recuperarem d
a crise, ou seja, daqui dois anos, no mínimo. “Quando os mercados começarem a ter sua recuperação e for restabelecido efetivamente o padrão de consumo, os países do Bric (Brasil, Rússia, índia e China) retomam sua participação no mercado mundial. Nisso, a China tem vantagem por usar a estratégia japonesa de chão de fábrica, de melhoria contínua de produtos e produção”, avalia a economista da FGV.



O minicarro chinês Haima ME (no alto), inspirado no famoso Smart ForTwo (abaixo) (Foto: Nir Elias/Reuters)

A força de Xangai

“China é uma coisa, Xangai é outra.” Assim o gerente de engenharia de manufatura da General Motors Shanghai, Osni Caniato, descreve a “capital econômica” chinesa. Com nove anos de trabalho na China no currículo, o brasileiro conta que a cidade é a que mais abriga estrangeiros, devido à concentração de multinacionais no local. Segundo ele, a cidade com 21 milhões de habitantes possui tudo o que uma metrópole de país de primeiro mundo pode oferecer.



O motivo da reforma urbanística de Xangai foi exatamente atrair investidores e empresas estrangeiras. Ao desenvolver sua indústria, a China optou por espalhar as sedes das empresas por todo o país, assim, caso houvesse um ataque em circunstâncias beligerantes, a economia do país não seria destruída facilmente. Por esse motivo, apesar de as sedes das principais montadoras chinesas estarem espalhadas pelo território – como ilustra o infográfico abaixo – elas mantêm subsidiárias ou escritórios em Xangai.



Não é a toa, que a General Motors irá transferir parte do comando de suas operações para a região. De acordo com a companhia, a “Nova General Motors” terá Xangai como sede de suas operações internacionais. Ela será comandada por Nick Reilly, que acaba de ser nomeado vice-presidente da GM International Operations (GMIO).



Mais do que concentrar empresas chinesas e multinacionais no mesmo local, Xangai é o ponto de saída – ou de entrada – dos produtos resultantes dessas trocas comerciais, negociadas com outros países: a cidade abriga o porto mais importante do país. Assim, o nome Xangai (Shanghai), que significa “sobre o mar”, ganha mais um sentido para o mundo chinês.



China X cópias

O fator preço ainda não é o grande trunfo para quebrar a barreira do mundo oriental que usa a palavra “cópia” para fazer referência a qualquer produto “made in China”. Quem definirá a abrangência dos produtos chineses será o avanço tecnológico.



Na avaliação da professora da FGV, foi a cópia de produtos de outros países em si que forçou a China a desenvolver a própria tecnologia. “À medida que se pediu qualidade, ela foi atrás. A melhora dos produtos é visível”, acrescenta Celina. Ela lembra que a mesma visão de falta de qualidade tinha-se dos carros japoneses e sul-coreanos.



Evolução vista de perto pelo diretor de engenharia de manufatura da General Motors Shangai, Gerson Pagnotta. “O conceito de cópia veio do passado, de como eles começaram a indústria local. O mercado asiático começou desse jeito. Agora, as grandes fábricas são globalizadas, a tecnologia que a China tem é igual a das melhores do mundo”, observa o executivo.



Embora o país tenha apresentado todo o seu potencial de desenvolvimento de produtos no Salão de Xangai deste ano, no mesmo evento ela também mostrou o aperfeiçoamento das cópias. As “inspirações” no mundo ocidental renderam modelos como o Haima Me, baseado no smart fortwo, o Lifan 320, com as linhas do Mini Cooper, o Haima 3, “clone” do Mazda M3, e a limusine Geely GE, uma “leitura” do Rolls-Royce Phantom.



Em defesa da indústria do seu país, Charles Tang já adianta que os próximos lançamentos na China surpreenderão a concorrência. “Existe esse preconceito com a China, mas agora os produtos têm melhorado muito em qualidade e design. No final deste ano serão lançados novos carros com designes incríveis”, ressalta.



O que a China teve nas últimas três décadas foi priorizar a “prosperidade a qualquer custo”, como define Tang. Segundo ele, mesmo que isso significasse arcar com os custos de impactos ambientais e desigualdade social. Os Estados Unidos e o mundo assistem ao resultado agora.


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